quinta-feira, maio 28

Há vida após a cirurgia cardíaca

Dante Senra
Phd pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e médico com especialidade em Cardiologia, Terapia Intensiva e Clínica Médica.
 Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver.
                                                               Dalai Lama 
 
Sempre afirmo a meus pacientes que deverão ter vida normal após a cirurgia cardíaca. Porém, diante de algumas sugestões no pós-operatório, tais como abandonar o tabagismo, realizar exercícios físicos, moderação na dieta, no estresse e no trabalho, freqüentar o consultório médico a cada 6 meses e realização de exames periódicos, o questionamento é inevitável no sentido de que a promessa não foi cumprida. Há a sensação de que os projetos de vida foram substituídos por estratégias de sobrevivência. Entretanto, a ausência destes cuidados configura uma forma anormal de viver. Desde nossa primeira leitura do O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry, existe a questão do “Por que trabalhamos sempre como se algo superasse, em valor, a vida humana, mesmo sabendo que esta não tem preço?”. 
 
Talvez, porque para muitos, boa qualidade de vida tem sido confundida com vida boa do ponto de vista material. Claro está que o conceito de qualidade de vida guarda forte componente subjetivo e individual, porém o termo qualidade de vida ligada à saúde baseia-se em dados mensuráveis e mais fáceis de ser atingidos.
 
Deste modo, cabe informar que grande parte dos pacientes submetida à cirurgia cardíaca realizou mudanças, ainda que transitoriamente, em seu estilo de vida e com isto alcançou reduções ainda mais significativas em seus riscos cardiovasculares. Assim, na maioria dos estudos, no pós-operatório, a porcentagem dos pacientes que fumavam se reduziu de 24% para 12%, a proporção dos que realizavam exercícios físicos regularmente aumentou de 16% para 47% e a porcentagem dos que seguiram uma dieta pobre em gorduras saturadas aumentou de 34% para 72%.
 
É ainda inquestionável a melhora da qualidade de vida do paciente operado que apresentava sintomas antes da cirurgia, já que esta proporciona condições de recuperação da capacidade e condicionamento físico com retorno precoce à vida profissional e social, alívio dos sintomas e sensação geral de bem-estar com melhora da auto-estima, redução do risco de novos eventos cardíacos e portanto maior segurança e confiança.
 
Ainda, se considerarmos que as doenças cardiovasculares não diagnosticadas e/ou não tratadas são a maior causa de mortalidade em nosso meio, o mito de que, se você foi operado do coração, está no final da vida deixa de existir e você vai ter que arranjar outra causa para viver mal ou morrer precocemente. Porém, não é preciso esperar pela cirurgia para modificar seu estilo de vida e procure lembrar-se que muitas vezes a vida que nós levamos não nos deixa viver.

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