O roteiro repete os palanques da oposição. No palco, parlamentares descontentes com o governo se revezam no microfone para esbravejar contra a condução da economia e a falta de confiança no país aos olhos dos grandes investidores. No ponto alto dos acalorados debates, propostas mais drásticas devem ensejar protestos pelo abandono da presidente Dilma Rousseff - justamente no momento de maior fragilidade desde que a petista chegou ao Palácio do Planalto, e, pior, um dia antes da primeira grande manifestação do ano contra o governo. Ironicamente, a pressão virá do maior partido aliado da gestão da presidente petista e um dos principais beneficiários de cargos na Esplanada dos Ministérios: o PMDB.
Neste sábado, os 27 diretórios vão se reunir durante a Convenção Nacional da legenda, em Brasília, com o objetivo, oficialmente, de reconduzir o vice-presidente da República Michel Temer ao comando do partido, posto que ocupa desde 2001. Mas, diante de um governo acuado por um processo de impeachment e das chances cada vez mais reais de a legenda aliada assumir o Palácio do Planalto, o evento também vai virar espaço para peemedebistas apelarem pelo rompimento da aliança com Dilma.
O descontentamento da conhecida ala rebelde com a presidente não é novidade. Mas chama atenção o fato de que os até há pouco defensores de Dilma, concentrados principalmente no PMDB no Senado, não estão tão dispostos a conter o tiroteio contra ela. Alguns, ao contrário, também preparam o gatilho. A defesa da petista ficará restrita a ministros e a diretórios considerados mais governistas, como o do Rio de Janeiro.
Conforme o planejamento, a convenção terá como principal votação a reeleição do vice Michel Temer para o comando do PMDB. Mas haverá pressão - não encabeçada, mas tampouco contida por Temer - para mudanças na relação com o governo. O partido que desde o primeiro mandato do ex-presidente Lula orbita em torno do petismo aproveita o auge da crise para ensaiar um desembarque. "A expectativa de haver uma grande manifestação vai influenciar na convenção. O ambiente está deteriorado e não vejo a possibilidade de ninguém fazer uma defesa aberta para o governo", afirma o deputado Osmar Terra (RS), um dos principais opositores à gestão petista e defensor do impeachment.
Na véspera do encontro, peemedebistas se concentraram em produzir moções que serão lidas durante a convenção - os documentos pedem desde o desembarque da aliança com o governo a adoção de posição uma independência na relação com o Planalto, com e sem a entrega de cargos. Os mais rebeldes rascunharam o posicionamento da cada diretório, e apostam em um cenário favorável a mudanças: pelos cálculos, há sete Estados que apoiam, além do abandono da petista ou ao menos uma maior liberdade, o impeachment de Dilma. Eles constataram, porém, que há o mesmo número de "submissos" ao governo. O restante aceitaria caminhar com Dilma - mas sem compromissos em votações.
A aprovação de qualquer medida que signifique mudanças mais profundas, como um rompimento, é tida como improvável para este sábado. Mas a expectativa é a de que os peemedebistas apontem para uma maior autonomia - o que já não é pouco. Se confirmada, a independência da legenda liberaria os congressistas, por exemplo, a votarem conforme quiserem no processo de deposição da petista, e muitos se dizem pressionados por suas bases eleitorais a darem um voto favorável. Por ser uma moção, o documento não traz mudanças no Estatuto do partido, mas representa um importante gesto político.
"O país está derretendo. Nós temos de tomar posição. Agora, estamos fazendo uma análise da consequência de qualquer cenário", afirma o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE). "A insatisfação não é nossa, é das ruas. E nós temos obrigação de nos preocupar com essa insatisfação", continua o senador.
Defensor de Dilma, o líder do PMDB na Câmara minimiza os questionamentos de seus correligionários. "Está todo mundo tentando entender qual a porta de saída para a crise. Vai ter muito barulho, mas decisão política, mesmo, eu não acredito. Será algo apenas para registrar posição. Mais gesto do que prática", afirma Leonardo Picciani (RJ).
Independentemente dos efeitos práticos da convenção, o ato político recheado de críticas à petista, somado às articulações feitas nos bastidores entre peemedebistas e tucanos, apontam para uma presidente cada vez mais isolada. Já está claro que, diante de um país sem rumo, a ordem agora é manter distância do Planalto. Ao menos enquanto Dilma estiver lá.
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